Semana passada participei da terceira edição do Citizen Cyberscience Summit, realizado em Londres. O evento ampliou bastante o meu entendimento sobre Ciência Cidadã, que era muito restrito aos sistemas de computação voluntária (aqueles que usam BOINC, por exemplo) e, mais recentemente, computação por humanos voluntária (volunteer thinking), como os projetos do Zooniverse e da Citizen Science Alliance. Na realidade, a maior parte da atividade na área de ciência cidadã está concentrada em projetos bem antigos onde os cidadãos estão mais envolvidos com a coleta de dados em campo, normalmente associada a projetos com fins ambientalistas. Veja por exemplo o projeto eBird. Outros projetos podem ser "achados" nesse site. Além desses projetos, duas outras coisas estão na moda. Uma é a tendência de ampliar a participação do cidadão em projetos de ciência cidadã - como as pessoas adoram cunhar termos novos, isso está sendo chamado de Extreme Citizen Science. A outra são os sistemas de sensoriamento participativo, que são muito importantes no contexto das cidades inteligentes. Assisti algumas apresentações de resultados do projeto EveryAware. A lição mais importante dessas apresentações é a atenção que é preciso ter sobre a calibragem dos sensores. Por exemplo, os projetos que usam o microfone do smartphone para medir poluição sonora precisam ser calibrados individualmente!
A apresentação que eu fiz sobre o trabalho que Lesandro está desenvolvendo sob minha orientação foi muito bem recebida. Algumas pessoas me procuraram depois da apresentação oferecendo dados de seus projetos para que a gente pudesse analisá-los. Uma dessas pessoas foi Amy Robinson do projeto EyeWire.
A palestra final do evento, proferida por Jeff Howe, autor do livro Crowdsoursing, foi muito interessante. A turma de sistemas colaborativos teria adorado, mas é muito provável que eles já tenham assistido isso aqui, que foi mais ou menos o mesmo que ele falou lá.
Acho que com a criação do Laboratório para Cidades Inteligentes temos uma boa oportunidade para juntar coisas de ciência cidadã mais "extrema" com sensoriamento participativo e crowdsourcing. Na minha opinião, isso passa por envolver de forma abrangente as escolas do município para que esse tipo de atitude possa ser despertada bem cedo em toda uma geração. De certa forma, envolver as pessoas no processo científico/criativo pode ser uma boa maneira de formar uma geração de pessoas com um senso crítico mais aguçado, mais questionadoras.
Notícias, apontadores, pensamentos e pesquisas do Laboratório de Sistemas Distribuídos da UFCG
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quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014
quinta-feira, 30 de janeiro de 2014
Contribuição de voluntários em projetos científicos que utilizam computação por humanos
Sistemas de computação por humanos permitem que pessoas executem tarefas que os computadores de silício ainda não são capazes de executar de forma satisfatória, mas que seres humanos são capazes de executar com eficiência e corretude. Muitas destas tarefas são ligadas à criatividade, processamento de linguagem natural, extração de informação em imagens, vídeo e áudio. Exemplos de sistemas de computação por humanos são Amazon Mechanical Turk, que permite que seres humanos executem tarefas que não estão relacionadas a um tema ou propósito específico, e a plataforma Zooniverse, que se dedica às tarefas relacionadas a projetos científicos.
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Exemplo de tarefa de classificação de galáxias no projeto Galaxy Zoo hospedado na plataforma Zooniverse |
Tarefas de computação por humanos são frequentes em pesquisas científicas que envolvem o processamento de grande bases de dados de imagens, por exemplo: pesquisas biológicas que trabalham com grande base de imagens coletadas do monitoramento de um dado ecossistema e pesquisas em astronomia que utilizam grande quantidade de imagens coletadas por telescópios. Em sistemas de computação por humanos com propósito científico, geralmente os seres humanos executam tarefas como um trabalho voluntário. Esse é o caso, por exemplo, dos projetos hospedados na plataforma Zooniverse.
Naturalmente, a participação dos voluntários executando tarefas nesses sistemas é fundamental para que os cientistas obtenham as informações que eles necessitam para conduzir suas pesquisas. Diversos estudos têm mostrado que os voluntários que contribuem executando tarefas nesses sistemas possuem diferente motivações, que vai desde curiosidade em computação humana de forma geral até um interesse específico em algum tópico científico, como astronomia, biologia, arqueologia. A motivação mais reportada pelos voluntários é o desejo de contribuir para ciência. Dessa forma, a motivação é um fator fundamental para levar o voluntário ao sistema e/ou mantê-lo contribuindo. Entretanto, os sistemas de computação por humanos precisam ser projetados de modo a permitir que essa motivação se converta em contribuição efetiva, por exemplo, permitindo que o voluntário tenha fácil acesso às tarefas e implementando recursos que façam com que a execução das tarefas seja uma atividade prazerosa e não entediante.
Diversas pesquisas têm sido desenvolvidas no LSD com o objetivo de entender como os voluntários realizam suas contribuições em sistemas de computação por humanos e como esses sistemas podem ser projetados de modo a serem satisfatórios tanto para os cientistas como para os voluntários. Um resultado recente dessas pesquisas é o artigo “Volunteers' Engagement in Human Computation Astronomy Projects”. Este artigo foi aceito para publicação na revista Computing in Science and Engineering do IEEE Computer Society. A pesquisa foi conduzida no LSD por Lesandro Ponciano e Francisco Brasileiro em cooperação com Robert Simpson que é membro da equipe que desenvolve e mantém o sistema Zooniverse na Oxford University, na Inglaterra, e Arfon Smith que é membro da equipe que desenvolve e mantém o sistema Zooniverse no Adler Planetarium, nos Estados Unidos.
A pesquisa é baseada em dados de aproximadamente 10 milhões de tarefas executadas por mais de 100 mil voluntários ao longo de dois anos em dois projetos de astronomia hospedados no Zooniverse: Galaxy Zoo e The Milky Way Project. A pesquisa se concentrou em analisar quatro características da contribuição dos voluntários: (i) frequência, que é o número de dias que o voluntário visitou o sistema para executar tarefas; (ii) produtividade diária, que é o número de tarefas que o voluntário executou nos dias em que ele esteve ativo no sistema; (iii) tamanho típico da sessão de contribuição, que é o tempo contínuo que o voluntário permaneceu executando tarefas em cada dia que esteve ativo; e (iv) tempo dedicado, que é o tempo total que o voluntário ficou executando tarefas no sistema, somados todos os dias em que ele visitou o sistema.
Além de definir essas características de engajamento, a pesquisa também focou em identificar distribuições de probabilidade que descrevem o comportamento dos voluntários no sistema em cada uma dessas características e as correlações entre as características. As distribuições de probabilidade e correlações foram obtidas com um claro propósito de servir como informação para que novos estudos possam ser conduzidos. Por exemplo, as distribuições podem ser usadas para gerar dados a serem utilizados em simulações que focam no estudo mais específico de algum comportamento dos voluntários.
O estudo também permite entender os padrões de contribuição dos voluntários e propor intervenções na forma como os sistemas são projetados de modo a torná-los mais efetivos. Por exemplo, o estudo mostra que de uma forma geral os voluntários exibem dois comportamentos: transiente e regular. Os voluntários transientes são aqueles que executam tarefas nos projetos um único dia e não retornam para executar mais tarefas. A maioria dos voluntários exibe esse comportamento. Os voluntários regulares são mais engajados em termos da frequência no projeto e da contribuição agregada (número de tarefas e tempo dedicado). Entretanto, a minoria dos voluntários exibe esse perfil. Embora significativamente diferente dos transientes, os grupo de voluntários regulares é bastante heterogêneo. Essa heterogeneidade também é analisada no artigo. Naturalmente, a contribuição de todos os voluntários (regulares e transientes) é importante para os projetos. Entretanto, o sistema pode ser ainda mais eficaz se projetado de forma que os voluntários se sintam mais dispostos a exibir um comportamento regular do que um comportamento transiente. Nesse sentido, os autores discutem como estratégias de recrutamento de voluntários, encorajamento de contribuição e design de tarefas podem ser desenvolvidas de modo a contribuir para que esse objetivo seja atingido.
Os trabalhos desenvolvidos no LSD na área de computação por humanos são apresentados nas Conversas LSD que ocorrem ao longo do ano. O conteúdo do artigo discutido neste post e outros trabalhos sobre engajamento e eficiência de voluntários em projetos científicos serão apresentados ainda no primeiro trimestre deste ano. A data e horário serão posteriormente definidos e divulgados aqui no blog.
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